Há exatos trinta e oito anos vivendo, convivendo e compartilhando da rotina do Complexo do Alemão, me pergunto se realmente chegou a hora da tão sonhada paz começar a reinar.
Sou de uma geração onde os tais "bandidos" andavam de trinta e oito(o famoso três oitão!) e não faziam a mínima questão de esconder o rosto, eliminar seus desafetos em plena luz do dia ou mesmo ditar as regras do pedaço. Prova disso é que eles viviam nos bares populares da favela e tinham muita intimidade com muitos moradores e eram temidos por outros tantos. Tudo isso no final da década de setenta, pois na década seguinte começaria o grande pesadelo, que foi a divisão das facções. Aquela harmonia entre os morros, os bailes noturnos que eram frequentados por todos, inclusive gente de fora, estavam com os dias contados.
O Comando Vermelho e o Terceiro comando causariam, nos quase trinta anos seguintes, o período negro não só para moradores, mas também para todo o Rio de Janeiro de maneira geral. A tal "faixa de Gaza" se instalou de forma tão artroz, que o simples gesto de atravessar a rua e ir a padaria se tornou um fator de risco. As pessoas tinham , simplesmente, que trocar suas rotas diárias para o trabalho e escola, pelo simples fato de o caminho de destino passar em frente a favela rival. Isso sem falar nas frequentes tentativas de invasão, que além de gerarem tiroteios históricos com brados dos clãs de ambos os lados, faziam o terror de quem se arriscava a ficar na rua até mais tarde e dos que estavam trancados em casa com medo de alguma bala ou algum bandido adentrarem em suas residências.
Os anos noventa só viram a coisa piorar. A idade média dos envolvidos nessa vida devassa diminuiu. Eram jovens de vinte e cinco, dezoito, quinza anos. A falta de experiência aliada ao encantamento que aquele meio de vida proporcionava, culminou no período "fashion" na bandidagem: Roupas caras, muitas mulheres (muitas delas vindas de fora), bailes, festas, shows de artistas famosos na comunidade (financiadas pelo tráfico) e o que mais se temia; a exploração sexual de meninas menores que ficavam expostas como carne de terceira nos palcos das favelas nos finais de semana. A coisa atraía muita gente de outras comunidades que, literalmente, enchiam as ruas e vielas, não só para a curtição, mas também, para o uso de drogas.
Muita conivência, muita violência, muito medo, muito silêncio; Muito tudo. Isso é o que se viu no Complexo durante décadas. Será que realmente a paz chegou? Por que tanto tempo até a tomada de uma atitude drástica como essa? Tudo isso poderia ser evitado? Poderes acima tem ou não culpa e influência nas questões da favela? Conivência? Propina?
São muitas as perguntas, mas o que se quer no fim das contas é uma vida sem medo, pois se sabe que o "marginal" não está só dentro das comunidades e sim espalhados em todos os os níveis da sociedade.
Paz !!!!!!!
Concordo com você meu caro. Você sintetizou a realidade.
ResponderExcluirAbração!!!